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opinião

A fuga do bem e a cultura da morte

As implicações dos avanços da pauta do aborto.

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Aborto
Embrião abortado (Foto: Direitos Reservados/Deposiphotos)

Ainda nas primeiras páginas do livro “A alma do mundo”, Roger Scruton, citando o filósofo Thomas Nagel, afirma ser uma “lei da natureza o fato de nosso pensamento científico se direcionar para a verdade, nossa moralidade, para o bem, e talvez (apesar dele não ir tão longe assim) nosso gosto, para o belo”. Ainda parafraseando o autor, o verdadeiro, o bom e o belo são perseguidos pelo homem, embora o falso, o feio e o confuso parecem também ser-lhes úteis.

A teologia cristã afirma que o homem é mau; mais enfaticamente, o homem já nasce mau. Considerando essa sentença uma verdade irrefutável, não nos surpreenderíamos com a tentativa insana de tornar o assassinato de bebês ainda no ventre de sua mãe algo socialmente aceito. Sua imposição no debate público não objetiva meramente sua tolerância, mas de promover uma bandeira e tentar modificar a maneira como as pessoas veem essa prática e se comportam nos mais variados aspectos.

No âmago dos debates sobre o aborto, encontra-se a discussão acerca do que é a vida e quando ela inicia. É fato indiscutível que quando um espermatozóide fecunda um óvulo, a única possibilidade é de que surja um ser humano. Jamais uma célula qualquer fecundaria um óvulo e faria uma mulher gestar um objeto, um ser inanimado ou algum animal de espécie qualquer. A partir da concepção, tudo se adapta no corpo da mulher para que ela nutra por um determinado tempo o que já é uma pessoa, logo, dotada de direitos.

Francisco Razzo, autor do livro “Contra o aborto”, leciona que “Quando um espermatozoide se une com um oócito, os dois deixam de ser o que eram para entrarem na composição de um organismo novo e distinto, que é chamado de zigoto em seu estágio unicelular original. Há uma importante mudança estrutural no ‘processo’. Enquanto células germinativas, espermatozóide e oócito tinham apenas potencial passivo para gerar um novo ser humano; depois da concepção, o novo organismo passa a ter potencial ativo. Este novo organismo começa a crescer pelo processo normal de divisão celular diferenciada em um embrião, repartindo-se em duas células humanas, depois quatro, oito e assim por diante. Se suas células humanas constituem um organismo humano capaz de contribuir para um autodesenvolvimento regular, previsível e determinado para o estágio maduro de um ser humano, por que já não considerar este ponto como fundamental para determinar uma nova pessoa?”. A verdade a qual nosso pensamento científico nos encaminha é de que a vida inicia-se na concepção.

Isaura Farias, em seu artigo Aborto, Eugenia e Racismo, argui perfeitamente que “a Constituição Federal de 1988 declara, no caput do artigo 5º, que o direito à vida é inviolável; o Código Civil em seu artigo 2º, que: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.” O Pacto de São José artigo 4º, que “a vida do ser humano deve ser preservada desde o zigoto”. Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana é um valor fundamental e supremo na Constituição Federal de 1988”.

Desde o século passado houve um crescimento massivo das Organizações Não Governamentais (ONGs). Há instituições para defender as mais variadas causas, entre elas a fauna e a flora, sobretudo do Brasil. Os brados contra o desmatamento e a feroz defesa dos ovos das tartarugas marinhas revelam que a vida é importante e precisa ser preservada. Todavia, assombra que há diversos grupos estruturados que reivindicam o que chamam de direito, mas abominavelmente o que anseiam é matar um indefeso ainda no ventre. O posicionamento de defender a legalização do aborto contrasta com a prevenção de queimadas e da proteção nos animais. É chocante que para muitos a vida humana seja inferior às árvores ou animais irracionais. Assim, fugimos da verdade científica e nos subordinamos aos nossos próprios desejos de forma egoísta e vil.

Há uma insistência em transformar a mentalidade das pessoas ao ponto de tornar moralmente aceita a prática do aborto. Para alcançar esse propósito, feministas, ONGs, Fundações, a própria indústria farmacêutica, entre outros, apresentam à sociedade argumentos recheados de eufemismos, cuja finalidade é relativizar a vida.

O mestre em bioética, Marlon Derosa, em um de seus livros desconstrói as justificativas abortistas. O professor revela que os argumentos são fundamentados em mentiras e evoca que “O discurso pró-aborto despreza a vida do feto e todas as consequências negativas do aborto para a mulher, como problemas psicológicos associados, traumas e depressão”. Entretanto, por tanto reproduzirem seus engodos, alguns galgaram até mesmo certa tolerância da sociedade, como o caso do aborto decorrente de estupro. Derosa ainda destaca um fato crucial: quem clama para manter a imputabilidade do aborto em caso de estupro, também pede para que não se exija boletim de ocorrência, ou qualquer outra prova.

Destarte, incorremos em alguns problemas, um deles a fragilidade para as fraudes. Qualquer mulher que desejasse abortar poderia vitimar seu filho alegando que foi vítima de um estupro. Ademais, o Estado passa a ser conhecedor da ocorrência de um crime tão brutal, afinal, autorizará o aborto sob essa alegação, mas, não disporia de informações para investigar e punir o criminoso.

Ainda sobre esta temática, Derosa conclui que “Quem defende aborto em caso de estupro, mas é contra o aborto legalizado, não percebe que está trabalhando contra suas próprias convicções, pois o precedente do aborto em caso de estupro é usado para avançar o aborto em outros casos. É questão simples e lógica: se a vida pode ser desrespeitada em uma situação, por que não pode em outras? A vida pode ser eliminada por conveniência? Jamais!”.

Não ousaria negar a dor incomensurável da qual padece a mulher vítima de uma violência como o estupro, contudo, apesar de não punir o aborto nestes casos, a Constituição Brasileira, no inciso XLV do artigo 5º, afirma que a punição não passará da pessoa do condenado. Ocorrido o aborto, indiscutivelmente, condena-se o inocente. Matar uma criança por ela ser resultado de um crime não livrará a mãe dos traumas que lhe sobrevirão; por contrário, carregará sobre si dores maiores. Acrescenta-lhe a responsabilidade de matar o próprio filho, o que naturalmente somos conduzidos a reprovar.

Os argumentos abortistas afastam-se da verdade e do bem, beiram a insanidade; por isso, seus defensores os apresentam paulatinamente. Estupro, anencefalia, risco de morte para a mãe e aos poucos a pauta avança. Marlon Derosa nomeia essa técnica de “ladeira escorregadia”. Explica: “Vemos com esse argumento dos casos de estupro e tantos outros que, a cada precedente que se abre, o discurso pró-aborto avança mais um passo para a legalização completa do aborto. Os defensores do aborto mentem quando dizem querer legalizar o aborto somente até o terceiro mês de gestação. Eles querem o aborto sem qualquer restrição, mas sabem que a proposta não pode ser apresentada por completo. Eles precisam avançar por etapas, para dessensibilizar a população gradativamente”.

Não contentes em matar uma vida ainda no ventre, já avançam para a defesa esdrúxula do que nomeiam “aborto pós-parto”. Essa pauta já circula por certos meios acadêmicos e não é possível contemplá-la sem se estarrecer. Realizado na Universidade de Melbourne, Austrália, entre os anos de 2011/2012 e publicado em 2013, no periódico britânico Journal of Medical Ethics, o artigo After-birth abortion: why should the baby live? (Aborto pós-natal: por que o bebê deveria viver?, em tradução literal) dos autores Alberto Giublini e Francesca Minerva, declara que:

Tanto o feto quanto o recém-nascido certamente são seres humanos e pessoas em potencial, mas nenhum deles é uma ‘pessoa’ no sentido de ‘sujeito de um direito moral à vida’. Entendemos por “pessoa” um indivíduo capaz de atribuir à própria existência algum valor básico (pelo menos), de modo que ser privado dessa existência representa uma perda para ela. Isso significa que muitos animais não humanos e indivíduos humanos com retardo mental são pessoas, mas todos os indivíduos que não estão em condições de atribuir qualquer valor à sua própria existência, não são pessoas.

Continua:

Se critérios como os custos (sociais, psicológicos, econômicos) para os pais em potencial são motivos bons o suficiente para fazer um aborto mesmo quando o feto é saudável, se o status moral do recém-nascido é o mesmo do feto e se nenhum tem qualquer valor moral pelo fato de ser uma pessoa em potencial, então as mesmas razões que justificam o aborto também deveriam justificar o assassinato [sic] da pessoa em potencial quando ela está na fase de um recém-nascido.

O artigo repercutiu em vários veículos de comunicação e para amenizar as acaloradas discussões, os autores escreveram uma carta desculpando-se pela divulgação do artigo. Criam que as discussões deveriam permanecer dentro dos muros filosóficos da academia. Suas escusas, porém, não contrariam sua tese. Replicaram que ela era mero exercício de lógica. Se um feto seria, para eles, uma pessoa em potencial, por isso pode ser abortado, por que um recém-nascido, que não passaria de uma pessoa em potencial, não poderia ser assassinado?

Foi esta mesma percepção, de relativizarmos a vida e valor das pessoas, que manchamos a história da humanidade com o holocausto judeu. É difícil elencar quantas barbaridades podem advir com a naturalização de práticas espartanas e de certas tribos indígenas no que concerne à vida. Retornaríamos ao barbarismo e a cultura da morte superaria o bem.

Leia agora o poema do poeta Jénerson Alves, declamado de improviso na ocasião do II Festival Pró-vida:

E a vida está no beijo
No beijo de Ana Maria
Ou mesmo Maria Ana
Tanto faz, Tendo desejo
Tendo a luz e tendo fé
Sei que a vida é
Algo doce, inexplicável
Tocado na melodia que
Apaixona e irradia
E um sentimento inefável.

Tá na cor do afrodisíaco
E também no acalento
No batimento cardíaco
No passo ligeiro ou lento
A vida tá na aurora,
Tá na fauna, tá na flora
Em tudo que o mundo tem
A vida toda aparece
Como a lua que parece
Um amor que nos faz bem.

E este festival pró-vida
Com certeza nos convida
Para uma outra consciência
Outra luz e outra essência
De uma sublime existência
Que vai muito mais
Do que esta terra pequenina
Mas na consciência divina
Que pulsa no coração
De enxergar ao seu próximo
Como sendo um irmão.

De ver cada poesia
Traduzida em cada olhar
E sentir aquela essência
Do verde que há no pomar
É sentir que a vida é
Um Presente natural,
Um dom espiritual
E a gente tem o direito,
Sim, de ter a vida
Porém, de tirar não tem…
Tem o direito de amar,
Direito de fazer o bem
E que a gente faça da vida
Desta forma que eu combino
Um sacrossanto hino
Louvando a Vida também!

Serva do Cristo Vivo, é casada com Diógenes Rocha e mãe de Luiza, Adonai e Maria Júlia. Amante da literatura, é escritora. Formada em Letras, pós-graduada em Linguística. Servidora pública como professora do Estado de Pernambuco.

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