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Movimento Igreja Sem Política

No Brasil, a legislação coloca limites entre a política e a religião.

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Igreja Sem Política (Foto: Reprodução/YouTube)

Eu fiquei extremamente curiosa com um grupo de protestava na 31ª edição da Marcha Para Jesus que aconteceu em 8 de junho deste ano, em São Paulo. Então eu fui pesquisar mais de perto e descobri um grupo de evangélicos que foi para a rua com faixa onde se lia “igreja sem política”, para reclamar da politização na religião.

A presença de políticos é muito comum no evento. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recusou o convite e não participou, mas outros políticos marcaram presença como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que foi muito aplaudido pelos participantes. O ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, representou o presidente e foi vaiado quando citou o nome de Lula. Também participaram o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça e Benedita da Silva. No evento os políticos foram elogiados. O organizador da Marcha e apóstolo da Igreja Renascer em Cristo, Estevam Hernandes Filho, disse, de cima do palco, “Tarcísio, eu te amo”.

A Marcha Para Jesus surgiu em Londres, no Reino Unido, em 1987. No Brasil, a primeira edição aconteceu em São Paulo, no ano de 1992. Desde o início, o evento está, direta ou indiretamente, ligado à política. Foi do ex-senador Marcello Crivella a ideia de criar um dia especial para a celebração. A festa foi incorporada ao calendário, em 2009, quando o presidente Lula, então em seu segundo mandato, sancionou a lei federal 12.025 criando o Dia Nacional da Marcha Para Jesus que deve ser comemorado, anualmente, no primeiro sábado subsequente aos sessenta dias após o domingo de Páscoa. No Brasil, a Marcha é liderada pelo apóstolo Estevam Hernandes.

O protesto aconteceu exatamente por essa influência política em um evento que deveria ser somente em louvor a Jesus Cristo. A Marcha é um exemplo para demonstrar como a política está infiltrada na igreja.

O vice-presidente do movimento Igreja Sem Política, José Luiz Barboza Filho, em entrevista à Folha, disse que na Bíblia e no ministério de Jesus não há menção a vínculo político. O grupo que defende a prática religiosa livre da ação política se comunica pela internet. No site igrejasempolitica.org, os evangélicos são convidados a fazer parte do movimento. Diz para os crentes denunciarem as igrejas evangélicas que são comprometidas com política, que defendam candidatos publicamente, a eleição de membros a cargos eletivos e que façam propaganda política em cultos e cerimônias. Os organizadores do movimento dizem que é para denunciar também líderes que praticam doutrinação ortodoxa e que coagem os membros a acreditar que a igreja “é a recebedora de uma comissão divina que autoriza esse tipo de serviço”.

No Instagram, o movimento tem 350 publicações, 2.125 seguidores e segue 5 perfis até a atualização deste artigo, em 23 de julho deste ano. 

Igreja Sem Partido

Além do grupo Igreja Sem Política, existe outro movimento, de nome parecido, que é o Igreja Sem Partido, que também critica a influência política nas congregações cristãs. Uma publicação tinha o seguinte texto: “Jesus nos mandou andar pela verdade. Infelizmente, muitos pastores se desviaram dela por interesses da carne, abandonando os frutos do Espírito. Adorando homens em vez de Deus, passaram a espalhar mentiras, a criar pânico nas igrejas, incentivar o ódio, causar brigas e promover perseguição. Chegaram a desvirtuar o propósito do jejum, orar pelas causas erradas e inventar profecias que nunca serão cumpridas. Com tudo isso, colocaram suas próprias igrejas em risco. Quando nada do que eles disseram acontecer, ficarão desmoralizados diante do povo e da sociedade. Causaram escândalos, divisões e impediram que muitas pessoas ouvissem a Palavra de Deus. Em vez de aproximar pessoas de Cristo, afastaram muitos”. Outra postagem dizia que “pastores que estão usando suas igrejas para fazer campanha eleitoral estão vendendo a fé do povo. Esses líderes podem até ganhar algo em troca, mas estarão se condenando a si mesmos, porque os templos e a fé do povo não podem ser comercializados”.

Também há postagem criticando o jejum que, segundo o movimento, foi organizado para gerar voto. A postagem diz que muitos pastores espalharam mentiras, criaram pânico nas igrejas e incentivaram o ódio. Diz que, quando nada do que afirmaram se realizar, os pastores que defenderam participar desse jejum estariam desmoralizados. A postagem não citou o nome do ex-presidente Jair Bolsonaro e de pastores, mas sabemos que, nas eleições do ano passado, alguns evangélicos organizaram 30 dias de jejum pedindo a Deus a vitória de Bolsonaro. Essa postagem, comentando sobre o jejum, foi veiculada no Instagram em 27 de outubro, três dias antes do segundo turno das eleições que ocorreu em 30 de outubro de 2022. 

A opinião das pessoas

Em um dos comentários deixados na postagem sobre a convocação para o jejum, uma mulher escreveu que vê “as pessoas se afastando da igreja porque não conseguem mais ouvir a Palavra de Deus, mas discurso político”.

Na minha página nas redes sociais, eu postei sobre o tema da igreja sem partido. Recebi alguns comentários como, por exemplo, de um pastor, que disse que a igreja não precisa de escolher um partido, mas precisa escolher um lado. O pastor disse que os líderes religiosos devem conscientizar os membros sobre ideologias que vão de encontro aos princípios do Evangelho. O pastor concorda com uma igreja sem partido, mas não sem consciência política. Outro comentário foi de um advogado que disse que seria ótimo a igreja não ter partido, pois cada pessoa teria consciência e liberdade de escolha. Mas que a igreja só não pode ser apolítica, pois não pode ser composta por acéfalos.

Uma pessoa defendeu que a igreja precisa se posicionar politicamente. A educação política na igreja impedirá que crentes votem em partidos de esquerda como o Partido dos Trabalhadores que trará o ditador Ortega, da Nicarágua, para o Foro de São Paulo. A pessoa lembrou que esse ditador perseguiu padres e pastores em seu país. Aqui, segundo o comentário, o presidente Lula recusou o convite para participar da Marcha Para Jesus, pois odeia crente. A pessoa que deixou a sua opinião na minha rede disse que é contra a igreja ser palanque, mas defende a educação política. Afirma que cristão tem que parar de votar no carrasco. Disse que cristão não deve votar em comunista e ditador. Já uma jornalista comentou que o parlamento sem igreja também precisa crescer. Apesar de todas as postagens serem públicas, eu optei por não citar os nomes das pessoas.

O que diz a lei

No Brasil, a legislação coloca limites entre a política e a religião. Por exemplo, as pessoas podem denunciar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e à Procuradoria Regional Eleitoral (PRE) uma igreja que fizer propaganda de pré-candidato em época de eleição. Essa prática é crime de abuso de poder econômico e crime eleitoral, de acordo com artigo 37 da lei 9.504/1997. Candidato também não pode receber doação direta ou indireta em dinheiro de igrejas em época eleitoral, de acordo com artigo 24, inciso VIII, da mesma lei. Ainda é proibido doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor um bem ou uma vantagem, inclusive emprego ou função pública, segundo o artigo 41-A da lei já citada. Em seu site, o movimento Igreja Sem Política cita a lei e diz para as pessoas denunciarem crimes de líderes religiosos. Não é crime políticos participarem de um evento religioso público como foi o caso da Marcha Para Jesus.

Nota de retificação

Esclareço que este artigo foi atualizado em 23 de julho de 2023 para corrigir informações publicadas no texto intitulado “Movimento Igreja Sem Partido”, publicado no portal Gospel Prime, em 12 de julho de 2023. Explico que, apesar de ter nomes parecidos, ambas as instituições aqui citadas são independentes, não tendo relação entre si.

Jornalista, teóloga e professora. É doutoranda em Teologia pela Escola Superior de Teologia, no Rio Grande do Sul. Tem mestrado em Teologia pela Escola Superior de Teologia. Pós-graduação em MBA Gestão da Comunicação nas Organizações pela Universidade Católica de Brasília. Bacharelado em Comunicação Social, Jornalismo, pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília. Licenciatura plena em História pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília. Bacharelado em Teologia pela Faculdade Evangélica de Brasília

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