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Os atributos do ser humano

A harmonia entre racionalidade e espiritualidade

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Homem orando num bosque. Foto: Naassom Azevedo / Unsplash)

Tendo estudado sobre a criação do homem e da mulher, bem como sobre a nossa própria constituição física e imaterial, vejamos agora, dando sequência aos nossos estudos sobre antropologia bíblica, alguns dos principais atributos, isto é, características que são peculiares à nossa humanidade. Estas características nos distinguem das criaturas inferiores, isto é, os animais.

A espiritualidade humana

A origem divina do nosso espírito

Reafirmamos nossa convicção quanto:

a) A procedência de nosso espírito: “…Deus, que o deu” (Ec 12.7). A menos que Deus dê espírito ao embrião formado no útero materno, este embrião estará morto. Não há ciência alguma que possa criar ou dar espírito a um corpo. Somente o Criador “é quem dá a todos a vida, e a respiração” (At 17.25).

b) tempo em que foi criado nosso espírito: a Adão (e pressupõe-se que também à Eva) Deus soprou-lhe fôlego de vida, injetando alma e espírito no corpo criado do pó (Gn 2.7). Aos demais humanos, porém, todos nascidos de mulher, Deus deu-lhes o espírito na concepção intrauterina. Isso é, formado o embrião pelo encontro do gameta masculino com o gameta feminino, então, simultaneamente, vem o próprio Deus e dá espírito a este corpo formado. Espírito, alma e corpo se desenvolverão juntos.

Rechaçamos peremptoriamente a teoria da preexistência do espírito (defendida nos primórdios do Cristianismo por certas autoridades da Igreja, como Orígenes de Alexandria). Supor que os espíritos existiam antes dos corpos pelo fato de Deus fazer declarações como “Antes que te formasse no ventre de tua mãe, te conheci” (Jr 1.5) é violentar o texto sagrado!

Textos bíblicos como esse falam da ONISCIÊNCIA DIVINA, para a qual passado, presente e futuro são perfeitamente conhecidos; de modo algum isso significa que Deus conheceu-nos por meio do nosso espírito preexistente.

O anseio natural do espírito humano

É comum se dizer que o espírito do ímpio anela pela presença de Deus. Não só o comentarista da Lição, Claudionor de Andrade, faz esta afirmação, como outros mestres também o fazem. Walter Brunelli, por exemplo, escreve:

O espírito é o agente que desperta no homem a necessidade de encontrar a Deus. Ele está latente na alma do ímpio, apenas anelando pelo Criador, na esperança de que um dia o entendimento (que está na alma através da mente) se abra para Deus e esse indivíduo, cuja alma ele vivifica, nasça do Espírito. […]. Agostinho disse: “O homem é irremediavelmente religioso”. Estas declarações reforçam a afirmação de que o espírito do homem anela por Deus. [1]

Entretanto, não me parece existir uma declaração bíblica que favoreça esta tese do anelo do espírito ou da alma do ímpio pela presença de Deus. Referências como Salmo 42.1 não podem ser usadas para favorecer tal tese, já que nestes textos temos declarações feitas por justos, e não por ímpios, isto é, por pessoas que já temiam ao Senhor – como é o caso de todos os salmistas e autores bíblicos que se dirigem a Deus falando do anseio pela Sua presença. De fato, o espírito regenerado anseia por mais de Deus.

Quanto ao espírito do ímpio, parece-me mais adequado percebê-lo como um “morto”, não no sentido literal, mas no sentido teológico: ele está separado de Deus, “morto em delitos e pecados” (Ef 2.1). Paulo ainda é mais enfático quando, descrevendo os ímpios, assim fala do nosso estado anterior à iluminação do Espírito e a fé: “Não há ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus” (Rm 3.11; Conf. Sl 14.2-3;). Como pode ser verdade que o ímpio anela em seu espírito pela presença de Deus, se a Bíblia nos diz que não há ninguém que busque a Deus?

O estado natural do homem é de alienação de Deus, indiferença para com as coisas divinas, desprezo pelo evangelho. O próprio Deus o afirma: “a imaginação do coração do homem é má desde a sua meninice” (Gn 8.21). Como cantava Jair Pires, no seu famoso LP “O homem rico”, na música Folha Seca: “É uma folha seca caída no chão, que vai para onde o vento levar, assim é a vida do homem sem Deus, pobre miserável só pensa em pecar”.

Somente a ação da graça divina no interior do homem pode despertar seu espírito morto para entender e querer as coisas de Deus. De Deus é o querer e o efetuar (Fp 2.13). Na verdade, é o Espírito de Deus que anela incessantemente pelo homem, para salvá-lo e trazê-lo de volta ao paraíso perdido.

Revivificação do espírito humano

Antes da fé em Cristo, o espírito do homem está “morto em delitos e pecados”; mas através da fé em Jesus, tendo recebido no íntimo a iluminação do Espírito Santo, que convence o mundo do pecado da justiça e do juízo (Jo 16.8), o espírito humano é regenerado ou vivificado (Ef 2.1,5; Cl 2.13).

Na vida de outrora, ele só desejava viver para si; na nova vida, o espírito do homem deseja viver para Deus, anelando por sua maravilhosa presença.

A racionalidade humana

Deus é um ser racional

Uma das coisas que Deus mais abomina é ser retratado e venerado em imagem de escultura por meio de figuras animais, que são seres irracionais (Êx 20.4; Rm 1.23). O Criador não pode ser confundido com a criação! Diferentemente do que prega o panteísmo, Deus não é a natureza, antes está acima dela, sendo Senhor absoluto acima de todos os seres!

Nosso Deus vê, ouve, fala e age! Ele não só tem inteligência como é a própria fonte, a origem suprema de todo o conhecimento e razão! Dele procede todo dom perfeito e toda boa dádiva, sendo ele o grande “Pai das luzes” (Tg 1.17). E, como já vimos desde a primeira Lição, o ser humano foi criado à imagem de Deus, conforme a sua semelhança (Gn 1.27).

Logo, se Deus é racional e nos fez à sua imagem, conforme a sua semelhança, somos também seres racionais; não “animais racionais”, mas seres racionais! Aliás, anjos (no céu) e homens (na terra) são os únicos seres racionais criados por Deus – estas teorias fantasiosas quanto a existência ETs, seres superinteligentes buscando fazer contato com o homem, não passam de invencionices para impressionar a mente banal do homem comum.

A harmonia entre racionalidade e espiritualidade

A razão não é inimiga da fé, nem a racionalidade é antagônica à espiritualidade. Alguns dos mais célebres cientistas que o mundo conheceu foram homens tementes a Deus, cheios de fé. Senão leia a biografia de homens como Louis de Pasteur, Galileu Galilei, Isaac Newton, dentre outros.

O que acreditamos enquanto homens de fé é que existem realidades espirituais que estão fora do campo científico, não podendo pela mera razão humana serem explicados ou compreendidos. Mas não são realidades irracionais (sem razão ou abaixo da razão), mas supraracionais (isto é, que estão além do alcance da razão).

Como disse o apóstolo Paulo, “homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1Co 2.14).

O culto racional agrada a Deus

Novamente citamos o apóstolo Paulo que exorta: “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional(Rm 12.1).

O que significa exatamente a expressão culto racional (gr. logiken latreian) é assunto de debate entre os teólogos, mas cremos que o apóstolo está nos dizendo que a entrega do corpo (ou ser) por inteiro em sacrifício a Deus, como um templo ambulante, é nosso culto razoável ou adequado. Isto é, faz todo sentido, é muito lógico que agora renovados em nosso entendimento, nos dediquemos integralmente ao Senhor.

Assim sendo, agem como loucos diante de Deus aqueles crentes que tendo sido renovados em suas mentes, persistem na prática do pecado e andando segundo suas inclinações carnais.

A sociabilidade humana

A solidão é nociva ao ser humano

Já vimos na Lição 2, quando estudamos sobre a criação de Eva, que o próprio Deus se declarou contrário à solidão do homem: “não é bom que o homem esteja só” (Gn 2.18). Diz Salomão que “Quem vive isolado se preocupa apenas consigo e rejeita todo bom senso” (Pv 18.1).

Visto que o homem não é autossuficiente, ele necessita de companhia e de ajuda. O texto de Eclesiastes 4.9-12 é muito oportuno para demonstrar como “é melhor serem dois do que um”. O homem sozinho, vindo a cair, quem o levantará? Estando triste, quem o consolará? Se vendo em apuros, quem o socorrerá? Para muitos a solidão tem sido a porta de entrada para a clausura, a depressão e o suicídio.

A família é a origem da sociedade humana

“Deus faz que o solitário viva em família” (Sl 68.6) – este verso demonstra como é preferível viver em família a viver sozinho. Deus criou e Deus ama a família! É ele quem “faz com que a mulher estéril habite em casa, e seja alegre mãe de filhos” (Sl 113.9).

Todos já ouviram esta frase, que se atribui a Rui Barbosa: a família é a célula mater da humanidade. Não temos nenhuma dúvida quanto a isso, bastando olhar para a primeira família da terra a partir da qual toda raça humana veio a existir ou para a família de Noé que reconstruiu a humanidade pós-diluviana.

A Igreja de Cristo, a sociedade perfeita

Deus, em sua bondade, além de prover-nos uma família também deu-nos uma igreja a fim de que desenvolvamos laços afetivos e vivamos em comunidade, sendo mutuamente edificados. Por isso, “não deixemos de congregar” (Hb 10.25). É fato que a igreja não é “clube social”, mas é inegável que a igreja é o mais oportuno dos lugares para nos socializarmos, fazermos amigos mais chegados que irmãos (Pv 18.24).

A Igreja é a nossa família multiplicada “cem vezes mais”, como prometeu Jesus a Pedro (Mc 10.30). O próprio Jesus tratou os que obedeciam a Palavra de Deus como sua família espiritual (Mc 3.31-35).

A liberdade humana

O livre-arbítrio

Devido o bom progresso da teologia arminiana em território brasileiro, tem havido muitas e acaloradas discussões sobre o assunto livre-arbítrio, especialmente na internet. Obras de referência já foram escritas por autores nacionais ou traduzidas de autores estrangeiros, explicando o verdadeiro conceito de livre-arbítrio (que não é um termo bíblico, assim como trindade também não é), buscando fazer justiça à compreensão clássica dos cristãos evangélicos arminianos – entre os quais me insiro.

O próprio Jacó Armínio ensinava que o arbítrio do homem, separado de Deus pelo pecado, não é exatamente livre, mas totalmente escravizado pelo pecado, necessitando que uma ação preveniente da graça de Deus o restaure para que somente então o homem faça o bem que agrada a Deus. Muitos arminianos ficariam surpresos de ler isto:

“o livre-arbítrio do homem para o que é bom não somente está ferido, aleijado, enfermo, distorcido e enfraquecido; ele também está aprisionado, destruído e perdido. E seus poderes não estão somente debilitados e inúteis (a menos que seja assistido pela graça), mas está totalmente privado de poder (…) ficará evidente que nada pode ser dito mais verdadeiramente sobre o homem nesse estado do que o fato de que ele já está morto no pecado (Rm 3.10-19)” – Jacó Armínio.[2]

Armínio está afirmando que em razão do domínio do pecado sobre o pecador, não existe livre-arbítrio. Ou seja, somente Adão e Eva tiveram realmente arbítrio livre, mas quando pecaram, tornaram suas vontades cativas do pecado e é nesse estado de pecado que todos os homens vêm ao mundo, necessitados da ação da graça de Deus para poder fazê-los pensar, desejar e fazer o que é certo. Assim, somente o salvo teria de fato, livre-arbítrio, já que, como disse Jesus, “se o filho do homem vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (Jo 8.36). Até que essa libertação venha, “todo aquele que comente pecado é escravo do pecado” (v. 34).

O pecador escolhe que roupa, que carro e que relógio usar; escolhe a pessoa pra casar, a casa pra morar, o emprego, o político em que votar… Num aspecto social, ele tem arbítrio livre; no aspecto espiritual, porém, seu arbítrio sempre se inclina para as coisas carnais (Rm 8.5).

É tão importante o papel da graça de Deus, que sem ela nós seríamos incapazes de nos decidir por Cristo e pela salvação. Jesus mesmo disse: sem mim nada podeis fazer (Jo 15.5). Nada mesmo! Não existiria condição jamais de darmos “o primeiro passo para Jesus”, se ele não tivesse de fato dado o primeiro passo em nossa direção. O autor da carta aos Hebreus adverte para que não venhamos nos privar ou nos excluir da graça de Deus (Hb 12.15-17), pois se isso acontecer, nosso arbítrio voltará a ser escravo do pecado e estaremos incapacitados em nossa natureza caída de nos voltarmos para Deus.

Portanto, assim declaramos: o homem não tem livre-arbítrio nato para as coisas espirituais, mas depende da ação da graça de Deus para poder escolher a Cristo e a salvação. De si mesmo, sem a graça de Deus, novamente citando o hino de Jair Pires, o homem é um pobre miserável que “só pensa em pecar”.[3]

O ato de decidir

O Espírito de Deus está sempre conclamando o pecador, bem como dirigindo os crentes para o que é certo, para a vontade de Deus que é boa, perfeita e agradável (Rm 12.2). Todavia, o Espírito não obriga o homem a decidir fazer. Ele fala, ele chama, ele capacita e ele convence, mas mesmo pessoas convencidas de seus erros podem persistir no erro, como alcoólatras estão convencidos do mal que o álcool provoca e, no entanto, permanecem se embriagando.

O homem, visto que é um ser inteligente e autônomo, pode decidir fazer o que é certo ou o que é errado, conforme a inclinação de seu coração. Jamais poderá se queixar que está fazendo algo contra a sua vontade por uma superior força irresistível. Se o homem, convencido pelo Espírito, decide deixar o pecado, nem mesmo satanás é capaz de mantê-lo aprisionado, pois em resposta à sua decisão o próprio Senhor vem para derrotar o diabo e transformar a vida do homem pecador (Lc 11.21,22).

A soberania divina

O arbítrio humano, isto é, sua capacidade de escolher e decidir não anula a soberania divina. A liberdade humana não faz do homem um ser todo poderoso nem lhe permite ser e fazer o que ele bem entende e deseja. Tantas vezes quantas forem necessárias, o Senhor intervirá para abater e frustrar os intentos humanos. Os planos do Deus soberano não podem ser impedidos! (Jó 42.2).

A criatividade humana e o trabalho

A dignidade do trabalho

Também este assunto já foi estudado quando no terceiro trimestre do ano passado discorremos sobre a mordomia do trabalho. Evitaremos redundâncias, e tão somente afirmamos que o trabalho é parte do mandato cultural que Deus entregou ao homem, quando lhe ordenou multiplicar a sua espécie e dominar sobre a criação. Ainda mais claro fica quando é dito que o homem foi expulso do Éden “para lavrar a terra de que fora tomado” (Gn 3.23). Ressalte-se que Adão não deveria trabalhar porque pecou; o que é consequente do pecado é o enfado e a angústia do espírito do homem (Gn 3.19).

O trabalho é o meio comum pelo qual o homem deve obter dignamente o seu sustento, como está escrito: “Nem de graça comemos o pão de homem algum, mas com trabalho e fadiga, trabalhando noite e dia, para não sermos pesados a nenhum de vós” (2Ts 3.8).

A criatividade humana

Deus é criativo e nós compartilhamos deste seu atributo. Feitos à sua imagem e semelhança, também recebemos capacidade para criar ou modificar a natureza trazendo à existência novos objetos para nosso prazer. Se o homem não fosse criativo ainda estaria usando as túnicas que Deus lhe fez no Éden! Mas já não precisamos delas, pois o homem criativo inventou a indústria têxtil e nos entregou bonitas e confortáveis roupas, nos mais variados tecidos e nas mais variadas cores.

O livro de Daniel prenunciava que o conhecimento humano se multiplicaria (Dn 12.4), e nossa geração globalizada e informatizada comprova a veracidade dessa profecia. A Tv e a Internet são certamente as mais poderosas ferramentas criadas pelo homem, além de carros e naves espaciais. Criamos anestesia e remédio para cura de doenças graves que outrora dizimava populações inteiras. A criatividade humana, se usada corretamente, pode ser uma verdadeira benção para a humanidade!

Mas infelizmente, como disse Salomão, “o homem foi em busca de muitas astúcias” (Ec 7.29). Por esta razão, como dizia Martin Luther King, “nosso poder científico superou nosso poder espiritual. Nós temos mísseis teleguiados e homens desorientados”. O poder de criatividade do homem está maculado pelo pecado, e por esta razão não raro vemos invenções malignas, redundando em poluição, destruição, confusão e guerras! Somente Cristo pode redimir a nossa capacidade de criação, a fim de que, “quer comais ou bebais, ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus” (1Co 10.31).

Conclusão

Como pudemos ver, o homem é um ser dotado de atributos concedidos por Deus, mas que estão todos maculados pelo pecado, sendo necessário uma influência divina no interior do homem a fim de que ele use seus atributos corretamente.

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Referências

[1] Walter Brunelli. Teologia para pentecostais, vol. 3, Central Gospel, p. 60

[2] Jacó Armínio, As Obras…, vol. 1, CPAD, p. 473, 475

[3] O assunto “livre-arbítrio” é complexo, tanto que ele volta a se repetir na Lição 7, quando trataremos outros aspectos de nossa liberdade. Não devem professor e aluno travarem uma guerra nesta Lição por possíveis divergências, nem também reduzir o conteúdo da aula a apenas este ponto, que trata de um dos muitos atributos do ser humano em estudo nesta Lição.

Casado, bacharel em teologia (Livre), evangelista da igreja Assembleia de Deus em Campina Grande-PB, administrador da página EBD Inteligente no Facebook e autor de quatro livros.

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