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devocional

Bíblia on demand

Queremos o Evangelho com o filtro cor-de-rosa que rende milhares de likes dos webcrentes descolados.

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Jovens com a Bíblia no colo. (Hannah Busing / Unsplash)

Muita gente decidiu ler as notícias sobre a pandemia apenas uma vez ao dia. Sábio. Há de pensar bem no conteúdo consumido nesses dias.

Dentre estatísticas apavorantes, brigas políticas, memes do isolamento, dicas para acalmar as crianças em casa e as lives que vão do gospel ao sertanejo, todos têm buscado por algo que lhes dê um pouco de alívio nestes tempos desafiadores do Covid-19.

Não deveria ser algo difícil para nós, cristãos. Afinal, se você se intitula “evangélico”, “boas novas” está na raiz do seu nome. Nossas discussões cristãs virtuais, porém, também andam um pouco balançadas.

Num tempo em que os cristãos deveriam se preocupar mais em ajudar suas comunidades e injetar esperança nos amedrontados – como muitos estão fazendo – é curioso ver como alguns debates teológicos voltaram à tona.

Quem sabe, não seja tanto de se espantar. Afinal, o que cremos rege diretamente como reagimos à vida. Especialmente quando não podemos mais maquiar o que realmente somos por dentro. É difícil disfarçar na quarentena.

O que resta, para muitos, é isso: procurar por algo – uma notícia, um pouco de entretenimento, quem sabe até uma nova leitura de mundo – capaz de dar uma sensação de reconforto. Não necessariamente verídico, apenas, conveniente.

O problema, como cristãos, é quando caímos no erro tolo de acreditar que poderíamos fazer isso com a Bíblia. Como se pudéssemos fazer dela algo tão maleável quanto os algoritmos que determinam o conteúdo que nos interessa. Quando colocamos a Palavra à serviço de nossas escolhas dúbias, ao contrário de nos render ao senhorio do Seu Autor.

Quando tentamos casar a Palavra a um conceito todo “meu” de liberdade, que tenta de forma cambaleante assegurar que terei sempre um bom lugar ao sol. Ao mesmo tempo, essa mesma pseudo-liberdade disfarçada de revelação bíblica tenta camuflar o que está escancarado tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, que é o preço das renúncias que todo aquele que decide seguir a Cristo deverá pagar.

A porta estreita já não é mais trend. Ao contrário, queremos a Bíblia on demand, recortada a nosso bel prazer. Queremos o Evangelho com o filtro cor-de-rosa que rende milhares de likes dos webcrentes descolados. Não é isso que importa, afinal?

“Não! Não é isso que importa!”, pregam as pragas do Século XXI. Não podemos mais nos perder nas eternas discussões do “o que eu disse e o que você entendeu”.

Quando a realidade lá fora nos entrega os fatos difíceis e nos revela indubitavelmente nossa fragilidade humana, somos levados a admitir: o que precisamos, mesmo, é de uma Rocha firme sobre a qual construir nossas vidas. Algo que permanecerá, ainda que tudo passe. Algo completamente inspirado, totalmente infalível, absolutamente imutável, ainda que não conveniente. Precisamos da Palavra de Deus.

Se somos o povo das Boas Novas, temos hoje a chance singular de entregá-la a este mundo confuso e enfermo – e não porque somos a última bolacha do pacote. Não porque somos tão bonitos, ou inteligentes, ou bem relacionados politicamente. É apenas porque ouvimos as notícias de vida e fomos transformados por ela.

Não é preciso gourmetizar a Palavra. Ela serviu a simples pescadores que chacoalharam o mundo ao seguir o Mestre. Serviu aos cristãos que foram queimados vivos em Roma.

Serviu aos missionários que morreram no campo ao sofrer doenças tropicais. E será suficiente para nós, hoje também. Posso filtrar todo o conteúdo que leio, canto, assisto e acesso. Nunca a Palavra.

Ela só será um remédio eficaz se tomada na medida certa: na sua integralidade.

Mariana Madaleno é pastora e autora, formada em Relações Internacionais e parte do colegiado da Igreja da Cidade em São José dos Campos (SP).

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