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Entenda o significado e o propósito do holocausto na Bíblia

Estudo bíblico sobre a prática do holocausto, seu propósito e sua ligação com o sacrifício de Cristo.

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Altar do Holocausto. (Foto: Reprodução)

O que era o holocausto, por que ele foi praticado pelos patriarcas, ordenado e regulamentado por Deus na Lei mosaica e de que modo ele aponta para o sacrifício substitutivo realizado pelo Salvador Jesus?

Estas perguntas são respondidas ao longo do estudo. Meditemos!

O holocausto, o sacrifício mais antigo

Etimologia da palavra

A palavra holocausto, no texto hebraico é olah (que significa “aquilo que sobe” – Gn 8.20; 22.2-13); no grego é holokautôma, cujo significado é “oferta totalmente queimada”. Diz respeito ao tipo de sacrifício em que animais puros eram oferecidos a Deus sobre o fogo, onde eram totalmente queimados (Lv 6.22; Dt 33.10).

O sacrifício do holocausto é definido na Bíblia como “de aroma agradável” (Lv 1.9Gn 8.21), que é um sinal da aceitação divina e é usada como metáfora no Novo Testamento para expressar como um sacrifício cristão (não mais com morte de animais) é aceitável a Deus (Ef 5.2; 4.18).

Origem da prática de holocaustos

Como destacado por Beckwith, “muitas vezes dá-se atenção ao fato de que, depois do primeiro casal ter cometido pecado, Deus o vestiu com peles de animais (Gn 3.21), ressaltando assim a ligação entre pecado e morte. Talvez a resposta certa quanto à origem do sacrifício seja que, ao vestir o casal dessa maneira marcante, Deus instituiu o sacrifício indiretamente, não diretamente. Se assim for, então Abel, homem de fé (Hb 11.4), viu nisso prova de que, ao trazer oferta a Deus, os pecadores deveriam do mesmo modo reconhecer a sua culpa, por meio da morte de um animal” [1].

Assim, embora seja fácil encontrar sacrifícios sendo realizados por povos pagãos contemporâneos aos patriarcas, inclusive sacrifício humano (o que Deus abominava!), é nas narrativas bíblicas que encontramos a verdadeira e pura origem dos holocaustos religiosos, e Abel, filho de Adão, teria sido a primeira pessoa a oferecer sacrifícios ao Senhor.

Sobre a prática do holocausto encontrada entre os antigos pagãos, “se trataria de uma daquelas ordenanças primitivas que os seres humanos carregaram consigo na sua dispersão pelo mundo [após o Dilúvio], alterando-a e, em certo sentido, distorcendo-a no processo” [2]. Ou seja, foi uma boa tradição, que remonta aos primeiros seres humanos a habitarem a terra e que expressavam louvor a Deus e necessidade de um sacrifício, mas que veio a ser corrompida pelo pecado e pelas vãs imaginações dos descrentes.

Causas e propósitos do holocausto

Tomemos nota destas três palavras que estão intimamente ligadas ao holocausto: pecado, culpa e expiação. O pecado do homem o tornou culpado diante de Deus e digno de morte (Gn 1.16,17; Rm 6.23); Deus, misericordioso e gracioso, proveu para o homem um sacrifício substituto, o sacrifício de um animal cujo sangue deveria ser derramado e cujo corpo deveria ser queimado sobre o fogo santo. Assim procedendo com fé, arrependimento e temor, o homem recebia de Deus a expiação de seu pecado, isto é, a eliminação da condenação e o afastamento da ira de Deus.

Holocausto na História de Israel

Mesmo antes de Moisés e da Lei dada sobre o monte Sinai, ofertas queimadas já eram oferecidas a Deus. No decorrer da história, os holocaustos eram efetuados privada e publicamente. Vejamos alguns exemplos:

Período patriarcal

ABEL – Pastor de ovelhas como era, ofereceu sacrifício animal a Deus (Gn 4.4). Embora o texto não diga explicitamente que era uma oferta queimada, é o que depreende-se de todo genuíno sacrifício animal oferecido a Deus: ou eram oferecidos ao Senhor e comido pelo ofertante (como ocorreria com algumas ofertas no período mosaico), ou eram oferecidos ao Senhor e totalmente queimados. Mas de modo algum eram deixados ao sol para apodrecer e servir de alimento para abutres!

NOÉ – Nos primórdios da humanidade, encontramos Noé, pai de todos os seres humanos que viveram e vivem após o dilúvio, oferecendo holocaustos sobre um altar (Gn 8.20,21). Duas coisas são dignas de nota nos sacrifícios deste patriarca: 1) mesmo antes da regulamentação mosaica, Noé já sabia que a Deus agradava sacrifício de animais limpos (v.20); 2) o Senhor “cheirou o suave cheiro” dos sacrifícios de Noé (v. 21).

O sacrifício de Noé tinha um “suave cheiro” (isto é, perfume; hb. reyach). Que cheiro têm diante de Deus nossas orações? Há bom odor em nossos hinos? Nossos jejuns são agradáveis a Deus? E nosso proceder diário em família, no trabalho, no ambiente de estudo e na rua, tem exalado para Deus um perfume agradável? Oferecer a Deus adoração, alimentando discórdia com nossos irmãos, não é agradável a Deus (Mt 5.23,24); oferecer a Deus orações, tendo maltratado nossas esposas, não é agradável a Deus (1Pe 3.7); pretender ser amigos de Deus, enquanto procedemos segundo os costumes deste mundo, não é agradável a Deus (Tg 4.4). Devemos ser para Deus “o bom perfume de Cristo” (2Co 2.15). Deve haver cheiro de santidade em nossa adoração!

ABRAÃO – No famoso episódio em que Abraão levara seu filho para sacrificá-lo ao Senhor, Deus impediu o patriarca de concretizar o sacrifício de seu filho (era apenas uma prova da fé abnegada de Abraão, na qual ele foi aprovado com louvores), mas pôs diante dele “um carneiro preso pelos chifres num arbusto. Foi lá pegá-lo e o sacrificou como holocausto em lugar de seu filho” (Gn 22.13, NVI). Abraão não perdeu a oportunidade de adorar a Deus mediante um sacrifício de holocausto, e agora ele tinha mais razões para fazê-lo: seu filho fora livrado da morte e Deus providenciara um substituto para ele!

Não temos nós, a quem o Pai providenciou o sacrifício vicário – “o filho se nos deu” (Is 9.6; Jo 3.16; Rm 8.32) – mais razões ainda para oferecermos ao Senhor o sacrifício de louvor contínuo? (Hb 13.15). Há três sacrifícios que podemos e devemos fazer por meio de Jesus para elevarmos a Deus nossa adoração: primeiro, confessar o nome de Jesus (Hb 13.15); segundo, ministrar louvores a Deus (Hb 13.15); terceiro, fazermos o bem e repartir com os que estão em necessidade, “pois de tais sacrifícios Deus se agrada” (Hb 13.16).

JÓ – As referências aos sacrifícios em Jó mostram que o holocausto não deixa de ter um sentido de expiação (aliás, este é o sentido fundamental, como se pode ver em Lv 1.4; 16.24; 2Sm 24.25). É opinião de abalizados doutores nas Escrituras que Jó foi um patriarca contemporâneo ou que viveu muito próximo de Abraão, Isaque e Jacó. É-nos dito que Jó “se levantava de madrugada, e oferecia holocaustos” segundo o número de seus filhos, para que Deus não os punisse em razão de eventuais pecados cometidos nos banquetes que eles gostavam de oferecer (Jó 1.5).

Período mosaico

Como se pode ver nos primeiros capítulos de Levítico (especialmente 1.3-17; 6.8-13), livro em estudo este trimestre, no período mosaico, o holocausto passa a ser um dos elementos principais do culto e da adoração, vindo a ser uma das principais atividades dos sacerdotes: oferecer sacrifícios sobre o fogo em favor de todo o povo hebreu. Este sacrifício era oferecido em favor da nação diariamente, pela manhã e ao entardecer (Ex 29.38-43).

O altar do holocausto, construído de bronze e onde o fogo devia estar continuamente aceso na entrada do santuário (Lv 6.8-13), era o lugar santo onde estes sacrifícios foram comumente realizados desde os dias da peregrinação de Israel rumo a Canaã. Com a construção do templo de Salomão, finda o tempo de tolerância de sacrifício fora do santuário, exceto nas circunstâncias mais  urgentes (1Re 3.2).

Pertencia à classe dos sacrifícios expiatórios, isto é, eram oferecidos como expiação pelos pecados que os ofertantes tinham cometido. Mas eram também sacrifícios de ações de graças e, finalmente, um ato de adoração. Para o holocausto, os animais oferecidos deveriam ser considerados puros e não ter qualquer doença ou defeito físico – já apontando para a perfeita santidade de Jesus (Hb 7.26: “santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores”).

Período nacional

Apesar das regulamentações da lei mosaica, depois da entrada na terra prometida, com a morte de Moisés e de Josué e antes de haver uma sucessão regular de reis, cada pessoa continuava fazendo “o que lhe parecia certo” (Jz 17.6; 21.25), em questões gerais, mas também rituais.

A prática do sacrifício na vida de Israel foi duramente criticada pelos profetas, começando pelo profeta anônimo e 1Samuel 2.27-36, que denunciou a conduta profana dos filhos de Eli. E apesar das restrições impostas pela Lei, era comum encontrar sincretismo religioso no culto judaico. É no confronto de Samuel com Saul que vemos ressaltado o elemento mais importante na adoração: “obedecer é melhor do que sacrificar” (1Sm 15.22,23).

Nos dias do profeta Amós vemos a repreensão do Senhor em termos contundentes: “Odeio, desprezo as vossas festas, e as vossas assembleias solenes não me exalarão bom cheiro. E ainda que me ofereçais holocaustos, ofertas de alimentos, não me agradarei delas; nem atentarei para as ofertas pacíficas de vossos animais gordos” (Am 5.21,22).

Se a oferta do patriarca Noé tinha um perfume suave, agradável a Deus, os holocaustos dos judeus contemporâneos de Amós tinham um mal cheiro que irritava ao Todo Poderoso! Era um culto sem reflexão e introspecção, já que o holocausto pretendia fazer os homens perceberem a seriedade do pecado e da culpa, bem como a santidade e a justiça de Deus, mas eles não estavam atentando para isso.

Aliás, aqui está uma lição muito importante sobre o holocausto no Antigo Testamento: o sacrifício por si só não implicava em expiação de pecados, a menos que fosse precedido por um arrependimento sincero e contrição por haver ofendido a Deus; caso não fosse acompanhado desse arrependimento, o holocausto longe de expiar pecados, apenas acrescentava ainda mais pecado, por se estar tratando com leviandade uma oferta estabelecida por Deus!

Aplicado ao contexto cristão podemos afirmar seguramente: o sacrifício de Cristo é bom em si mesmo e capaz de remover nossos pecados e reconciliar-nos com Deus, mas isso não ocorre incondicionalmente, mas mediante a condição de crermos em Cristo e confessarmos nossos pecados. Sem esta fé verdadeira, o sacrifício de Cristo não nos trará o benefício do perdão e da vida eterna.

Deve-se dizer também que muitos sacrifícios sinceros foram oferecidos a Deus de modo agradável na história de Israel. Por exemplo, os holocaustos oferecidos por Davi e (2Sm 24.22-25) por Salomão (2Cr 1.6). No caso de Salomão, fica claro como a luz do sol que os sacrifícios por ele oferecidos só foram recebidos na consagração do recém-inaugurado templo (2Cr 7.1) porque foram precedidos de uma sincera oração, confissão e submissão ao Senhor, como se vê na longa oração registrada no capítulo 6 do segundo livro das Crônicas. Nenhum sacrifício apraz a Deus, a menos que seja precedido de arrependimento, confissão e fé! Se assim não for, é mera formalidade, culto da aparência que Deus abomina.

Jesus, o holocausto perfeito

O cordeiro de Deus

Uma das mais vibrantes declarações bíblicas sobre a pessoa de Jesus foi feita pelo seu precursor João Batista: “Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1.29). Não mais um holocausto oferecido pelos patriarcas ou sacerdotes, mas o cordeiro oferecido pelo próprio Deus, e não mais para afastar a culpa e a condenação somente, mas para purificar-nos interiormente, reconciliar-nos com Deus e fazer-nos herdeiros dos céus! Pois somente o seu sangue é que “nos purifica de todo pecado” (1Jo 1.7).

Transferência de culpa e justiça

Havia um ato especial antes da degola do animal a ser oferecido no sacrifício do holocausto: o ofertante deveria impor a mão sobre a cabeça do animal (Lv 1.4), o que representava transferência de culpa para o animal. Era um ato simbólico por meio do qual o ofertante se reconhecia um pecador e digno de morte, mas que naquele momento o animal inocente sofreria a pena em seu lugar a fim de o pecador tornar-se propício diante de Deus.

Que melhor gesto poderia tipificar a culpa dos nossos pecados que foi imputada sobre Cristo naquela horrenda cruz e, ao mesmo tempo, a justiça daquele Inocente que foi imputada sobre nós? O profeta Isaías ensina-nos que “ele foi ferido pelas nossas transgressões, e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e, pelas suas feridas fomos sarados” (Is 53.5).

Na cruz Cristo recebeu a nossa culpa; na cruz nós recebemos a justiça de Cristo. Na cruz ele foi feito pecado por nós; na cruz ele nos fez justiça de Deus. A declaração paulina é profunda nesse sentido: “Àquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2Co 5.21).

O último holocausto

O holocausto ou oferta queimada simbolizava a obediência passiva de Cristo e sua submissão à penalidade requerida pelo pecado do homem. Além disso, fazia referência à perfeita obediência de Cristo à lei de Deus, pela qual Ele fez por nós aquilo que jamais poderíamos fazer. Ele cumpriu “toda a justiça” de Deus (Mt 3.15) e, por causa disso, pode na cruz exclamar: “Está consumado!” (Jo 19.30), isto é, tudo está feito por completo.

Mentiroso é qualquer um que disser que veio para “completar” a obra de Cristo, ou que seu sangue não é eficaz para salvar pecadores, ou que outros sacrifícios precisam ser feitos hoje para salvação. Seja anátema tal evangelho mentiroso, que vai além do que nos foi anunciado pelos apóstolos do Senhor! (Gl 1.8,9).

Jesus foi o sacrifício completo, perfeito e irretocável,
suficiente para salvação de todos os que se achegarem a ele com fé.

Conclusão

Manifestemos ao Senhor toda nossa gratidão por seu imensurável amor e graça manifestos na pessoa bendita de Jesus. Àquele que como “cordeiro mudo” padeceu os horrores do calvário, tributemos louvores para sempre, pela salvação que ele nos deu quando na cruz riscou a cédula de morte que era contrária a nós (Cl 2.14), resgatou-nos do império da morte (Hb 2.14,15) e nos deu vida eterna! Sim, ao Cordeiro que foi morto, reviveu e agora vive para sempre (Ap 1.18), louvemos sem cessar.

Sola Gratia! Solus Christus!

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Referência

[1] e [2] R.T. Beckwith Novo Dicionário Teológico (Alexander & Rosner, orgs.), Vida, p. 1141

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