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estudos bíblicos

Os judeus messiânicos podem ser considerados cristãos?

A visão neo-testamentária da Igreja do Senhor Jesus é a união de judeus e gentios que creem em Jesus como seu Messias

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Uma resposta clara e objetiva seria sim. Pois o judeu messiânico é aquele que declara sua crença em Jesus como o Cristo/Messias prometido a Israel no Tanach (Antigo Testamento). Contudo, existem algumas controvérsias nos grupos chamados judaicos messiânicos em relação à vivência da fé no seio da cristandade, envolvendo os cristãos gentios, que precisam ser melhor entendidas.

Uma visão histórica do judaísmo messiânico

Quando se fala hoje sobre judaísmo messiânico nos soa como se isso fosse uma invenção do século passado. Ou seja, que o judaísmo messiânico surgiu no século 20, mas historicamente isso não corresponde a verdade. O judaísmo messiânico sempre existiu e isso desde o Pentecostes em Jerusalém, com o derramamento do Espírito Santo e o início da Igreja do Messias, como registrado em Atos 2.

De acordo com a visão neo-testamentária a Igreja do Senhor Jesus é a união de judeus e gentios que creem em Jesus como seu Messias e o Salvador do mundo prometido nas Sagradas Escrituras, cunhada na bela expressão “em Cristo”. Esse é o tom da epístola de Paulo aos Efésios, na qual o apóstolo, trata sobre a doutrina da Igreja.

Em Efésios 2 encontramos importantes declarações sobre a Igreja sendo formada por judeus e gentios: “Mas agora em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe [gentios], já pelo sangue de Cristo chegastes perto” (Ef.2:13). Em Jesus é feita a paz entre judeus e gentios, o muro é derrubado e dos dois povos é feito um (Ef.2:14), como está escrito:  “… para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz” (Ef.2:15b),  e ainda: “E pela cruz reconciliar ambos com Deus em um corpo, matando com ela as inimizades” (Ef.2:16).

Contudo, não podemos esquecer que no início a Igreja era na sua maioria composta de judeus. Os 12 apóstolos escolhidos por Jesus eram judeus (Mateus 10:1-5), os 70 discípulos eram judeus (Lucas 10:1-20), os 500 discípulos eram judeus e os quase 3 mil eram na sua maioria judeus – mesmo os que não eram judeus ainda assim eram prosélitos do judaísmo, ou seja, convertidos ao Deus de Abraão, Isaque e Israel (Atos 2:5,9-11,37-42) -, depois temos os quase 5 mil que creram nas imediações do Templo judaico em Jerusalém (Atos 4:4). Tais fatos nos levam a buscar entender o contexto judaico da Igreja do Senhor Jesus Cristo.

Os discípulos de Jesus no período dos Atos dos Apóstolos foram chamados de diferentes nomes: os do caminho (At.24:14,22); nazarenos (At.24:5); cristãos (At.11:26). O judaísmo messiânico, à época, era considerado mais uma das seitas judaicas pelo governo judaico local e pelo império romano, como os fariseus, saduceus, herodianos e essênios.

A cisão entre o judaísmo messiânico e os demais judaísmos

A cisão entre o judaísmo messiânico e as demais vertentes do judaísmo da época deu-se nos séculos primeiro e segundo com dois eventos similares de grande magnitude: a Primeira Revolta Judaica contra o império romano, que teve início no ano 66 d.C., e a Rebelião de Bar Kochba no ano 135 d.C.

Primeira Revolta Judaica 66 d.C.

Na primeira Revolta Judaica, os judeus messiânicos não se aliaram aos outros judeus na revolta contra o poderosíssimo império romano. Apesar de alguns outros grupos judaicos, também, não terem lutado contra os romanos, a recusa dos judeus messiânicos de lutar foi vista como um ato de grande traição pelos revoltosos, derrotados pelo império. A comunidade messiânica de Jerusalém saiu da cidade e se abrigou numa localidade denominada Pelz (FELDMAN, 2017, p. 142).

Segundo Flannery: “Para os judeus, essa deslealdade aparentemente foi irritante, e não deixou dúvida em seus espíritos de que o novo movimento se separara não somente da prática da Lei, como também do nacionalismo judeu” (FLANNERY, in Feldman, 2017, p. 142).

O resultado dessa revolta judaica foi a destruição do Templo de Jerusalém no ano 70 d.C.. Os judeus messiânicos viram na destruição do Templo o cumprimento da profecia do Senhor Jesus em Mateus 24:1-2: “E, quando Jesus ia saindo do templo, aproximaram-se dele os seus discípulos para lhe mostrarem a estrutura do templo. Jesus, porém, lhes disse: Não vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derrubada”.

A Rebelião de Bar Kochba 135 d.C.

Na rebelião de Bar Kochba (132-135 d.C.), os judeus messiânicos mais uma vez foram conclamados a enfrentarem o império romano, só que dessa vez debaixo da bandeira de um pretenso Messias chamado Bar Kochba (Filho da Estrela), título messiânico dado pelo grande rabino da época Akiva.

Mais uma vez os judeus messiânicos recusaram enfrentar o império romano, mas agora, por reconhecerem somente o Senhor Jesus como o Messias e mais ninguém.

Essa recusa significou a exclusão total do judaísmo messiânico das demais correntes judaicas no segundo século, situação que perdura até os dias de hoje.

Uma visão contemporânea do judaísmo messiânico

O judaísmo messiânico sobrevive e continuará a sobreviver, apesar de muitos abrirem mão de sua origem judaica, por meio da assimilação, casamentos mistos, ou conversões forçadas (Inquisição). Pois, ainda que secretamente, alguns praticantes mantêm seus ritos judaicos, embora tenham uma fé genuína em Jesus como Messias.

Antes da idade-média, os judeus messiânicos viviam nas proximidades das comunidades judaicas, apesar das hostilidades, por se sentirem mais ou menos confortáveis para poderem realizar suas práticas judaicas.

Durante a idade-média o número de judeus messiânicos era bem diminuto. Por não serem mais aceitos nem na comunidade judaica e também na cristã, de maioria gentílica e com certa aversão às práticas judaicas.

Já no período do Iluminismo, com a nacionalização dos Estados, o judaísmo messiânico experimentou um novo avivamento, claro que de forma bem discreta, devido ao número praticamente insignificante de judeus que criam em Jesus como o Messias, à época. Estes poucos judeus vivenciavam as principais práticas judaicas em seu dia a dia, como a guarda do shabat (sábado), cashrut (dietética judaica), bris (circuncisão), entre outras práticas.

Com o surgimento das igrejas étnicas (no século XIX) o judaísmo messiânico passou a receber uma maior atenção pela igreja de um modo geral. E na metade do século XX surgiu uma ala especializada de missões nas igrejas evangélicas, com foco em missões com etnia judaica, por meio de agências missionárias. Assim, temos o florescimento das chamadas Sinagogas Cristãs, Congregações Judaicas Messiânicas, Sinagogas Messiânicas. Na sequência temos as associações judaicas messiânicas, seminários judaicos messiânicos, etc.

A questão doutrinária

É claro que, assim como há divergências doutrinárias nas igrejas evangélicas, também há no movimento judaico messiânico. Divido as divergências em duas partes: teológica e prática.

1) Parte teológica: Questões como a divindade de Jesus, a tri-unidade divina, a escatologia. 2) Parte prática: shabat, cashrut, circuncisão, indumentária, símbolos, etc..

Devido o espectro do cristianismo ser tão amplo e complexo os judeus messiânicos podem ser considerados cristãos pela parte gentílica da Igreja de Cristo, embora alguns chamados judeus messiânicos não gostem dessa classificação.

Pastor Batista, Diretor dos Amigos de Sião, Mestre em Letras - Estudos Judaicos (USP).

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