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O espiritismo e a morte

Na sequência da série “A morte nas religiões”, vamos entender como o espiritismo explica o fim da vida.

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Espiritismo
Espiritismo (Foto: Direitos Reservados/Deposiphotos)

Na sequência da série “A morte nas religiões“, vamos entender como o espiritismo explica o fim da vida. A morte é assunto atual. Muitas famílias no mundo choram hoje a perda de parentes e amigos por causa da covid-19. Diante da dor e do luto, é importante entender a explicação dos seguidores sobre o tema.

Como a morte é entendida no espiritismo?

O livro “O evangelho segundo o espiritismo”, escrito por Allan Kardec, pseudônimo de Hippolyte Léon Denizard Rivail, publicado há 157 anos, diz que as pessoas morrem, deixando a Terra, para mundos mais felizes, quando estão curadas de suas enfermidades morais. A morte, longe de ser entendida como pavor e como o horror da decomposição, é vista como uma transformação feliz.

Como acontece essa transformação de acordo com o espiritismo? A morte física é o início do processo da desencarnação e posterior reencarnação. Filosoficamente falando, a morte pode ser comparada ao pôr do sol que representa, ao mesmo tempo, o nascer do sol em outro local. A morte é o fim do corpo físico e o início de outro ciclo de vida. Se a vida e a alma existem depois da morte, então a morte é explicada como sendo um bem para a alma porque esta exerce melhor a sua atividade sem um corpo.

Como entendem a desencarnação?

A desencarnação é uma mudança de plano segundo a crença espirita. É como uma pessoa que se muda de uma cidade para outra. É um fenômeno natural que ninguém pode evitar. A vida verdadeira não é a que a pessoa vive neste mundo, mas a espiritual. A vida espiritual é a vida normal do espírito. A vida terrestre é passageira. O corpo terrestre é somente um revestimento temporário do espírito.

Morrer e desencarnar são a mesma coisa?

Para o espiritismo não. Ambas são percebidas de forma diferente. A morte é entendida como o fim da vida. A extinção da vida física. Desencarnar tem outro significado na religião. É entendido como o desprendimento do espírito de tudo o que é terreno (físico). A alma, quando se liberta do corpo (que chamam de espírito), o faz somente do corpo físico. Quando desencarna, a pessoa continua sendo a mesma. Essa pessoa desencarnada tem as suas questões psicológicas e emocionais iguais quando estava viva. Desencarnada, a pessoa não se transforma em um novo ser. Toda a psiquê vai junto com ela.

Desencarnar é um ato de libertação espiritual. Acredita-se que é possível morrer sem desencarnar, mas não se desencarna sem morrer. A pessoa pode morrer, mas o espírito permanecer ligado ao corpo físico. Muitas vezes isso acontece entre os suicidas, de acordo com os espíritas. Outro exemplo que pode ser dado é uma pessoa que morreu e não tinha muita noção sobre o que acontece depois da morte. Então essa pessoa fica no cemitério mesmo grudado ao corpo. Existe uma equipe espiritual que promove o desenlace da alma ao corpo físico.

O que é reencarnar?

O fenômeno da reencarnação é diferente da desencarnação. Reencarnar é o retorno da alma ou do espírito à vida corporal, mas em um outro corpo que foi novamente formado para recebê-la. Essa alma não tem nada em comum com o antigo corpo no qual habitava. A alma pode se reencarnar em um corpo humano. Mas os espíritas não acreditam que uma pessoa possa reencarnar em uma planta ou em um animal porque isso seria um retrocesso. A alma somente se reencarna em um corpo humano.

A reencarnação explica o quê para Kardec?

Na defesa dessa teoria, Kardec disse que reencarnação é uma necessidade absoluta, uma condição inerente aos seres humanos. Só por meio de reencarnar é que as pessoas podem explicar de onde vêm, para onde vão e o motivo pelo qual estão vivendo. Todas as anomalias, a morte, a injustiça e o mal podem ser justificadas via reencarnação.

Por que acreditam em múltiplas vidas?

Porque acreditam na justiça divina. Entendem que, se houver somente uma vida, como afirmam outras religiões, não se tem explicação para a diferença de oportunidades que as pessoas vivem. Perguntam por que tanta diferença entre as pessoas se existe só uma vida? Entendem que, se houvesse somente uma vida, Deus deveria dar condições iguais a todos, senão Ele seria injusto.

É possível a pessoa se desprender antes mesmo da morte física?

O espiritismo acredita que sim. No livro “O céu e o inferno”, Kardec cita que “para o homem cuja alma se desmaterializou e cujos pensamentos se elevam acima das coisas terrenas, o desprendimento quase de completa antes da morte real. Ou seja, enquanto o corpo ainda tem vida orgânica, o espírito já penetra na vida espiritual. Fica apenas ligado por elo frágil que se rompe com a última pancada do coração.”

Por que algumas pessoas têm medo da morte?

Os espíritas pensam que as algumas pessoas têm medo da morte física por causa da ignorância a respeito da vida além-túmulo. Acreditam em Kardec que dizia que, durante a vida, o espírito está preso ao corpo por seu envoltório semimaterial ou perispírito. A morte seria somente a destruição do corpo e jamais a destruição do segundo envoltório que se aparta do corpo quando cessa neste a vida orgânica. Ainda segundo Kardec, na obra “O livro dos espíritos”, a observação mostra que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente. Que se opera gradualmente e com a lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é rápido, podendo-se dizer que o momento da morte é também o da libertação que se verifica logo após. Em outros, naquelas pessoas cujas vidas foram muito ligadas ao material, o desprendimento é mais devagar, podendo durar dias, semanas ou meses.

Acreditam no livre arbítrio?

Sim. Entendem que Deus deu livre arbítrio para as pessoas para que cumprissem a lei da evolução. Entendem que as decisões que as pessoas tomam nesta encarnação são lições que aprendem depois da vida. Os espíritas dizem que fazem diversas atividades no plano espiritual até estarem prontos para a outra reencarnação. No plano espiritual, os espíritas acreditam que reconhecem e trocam experiências com as pessoas que fizeram parte de suas vidas. desde que estejam em frequência igual.

Como a pessoas pode afastar o medo da morte?

Os espiritas acreditam que as pessoas devem de forma a conseguir cumprir seus deveres individuais e coletivos com a sua família e a sociedade. Também desenvolver uma educação moral baseada em valores éticos. Essas condições afastam o medo da morte porque levam a pessoa a ter harmonia íntima, ter paz na sua consciência.

Para atingir isso, é recomendável fazer sacrifícios e ações do bem para com todos. É necessário se desprender de bens materiais porque isso é um recurso que levam o espírito a ter paz na hora da desencarnação. Entendem que, quanto mais o espírito se identificou com a matéria, mais difícil será separar-se dela.

Por meio da atividade intelectual, moral e da elevação dos pensamentos a pessoa pode começar a se desprender do corpo mesmo ainda durante a vida. Dessa forma, quando a morte chegar, o desprendimento é quase instantâneo.

Antes de morrer a pessoa sofre para se desprender da vida?

Entendem que não porque, no momento do desligamento do espírito do corpo físico, independente das condições que o levaram à morte, a pessoa passa por uma momentânea inconsciência (um desmaio). A perturbação pode acontecer antes do desligamento, em um momento chamado de estado agônico (ou estado de agonia).

Esse sofrimento será mais leve ou mais difícil dependendo das condições espirituais da pessoa que está desencarnando. No livro “O céu e o inferno”, Kardec diz que “a passagem da vida corpórea para a espiritual produz-se um outro fenômeno que é a perturbação. Nesse momento a alma experimenta um torpor que paralisa momentaneamente as suas faculdades, neutralizando as sensações.

A perturbação pode ser considerada o estado normal no instante da morte. A sua duração é indeterminada, variando de algumas horas a alguns anos. O último suspiro quase nunca é doloroso porque ocorre em momento de inconsciência, mas a alma sofre antes dele a desagregação da matéria durante as convulsões da agonia e depois as angústias da perturbação. Esse estado não é geral, a intensidade e duração do sofrimento estão na razão direta da afinidade que existe entre o corpo e o perispírito.

Quanto maior for essa afinidade, mais penosos e prolongados serão os esforços da alma para se desprender. Há pessoas nas quais a coesão é tão fraca que o desprendimento se opera por si mesmo com naturalidade. O espírito se separa do corpo como um fruto maduro que se desprende do seu caule. É o caso das mortes calmas e de despertar pacífico.”

A religião acredita que todos os espíritos são bons?

Não. Dizem que existem os verdadeiros e os espíritos ainda em estado de ignorância que podem ser chamados de maus. Há os espíritos que guiam os espíritas e a própria humanidade e aqueles que se colocam contrários à evolução moral e espiritual das pessoas. Há falsos cristos e falsos profetas que não estão entre as pessoas vivas, mas entre os desencarnados.

A religião diz que esses falsos cristos e falsos mestres são espíritos enganadores, hipócritas, orgulhosos e falsos sábios. Os espíritas usam as palavras de Jesus Cristo para discernir o espírito bom do ruim. Citam o texto da Bíblia que diz que é pelo fruto que se conhece a árvore.

Inclusive, existe uma prece para afastar os maus espíritos. A oração deles diz o seguinte: “em nome de Deus Todo-Poderoso, que os maus espíritos se afastem de mim e que os bons me sirvam de proteção contra eles”. Os fiéis pedem aos bons espíritos força para resistir à influência dos maus espíritos. Pedem ainda luz para não serem vítimas dos maus guiadores. Clamam que sejam preservados do orgulho, da presunção, do ciúme, do ódio, da malevolência e de todo sentimento contrário á caridade. Esses sentimentos ruins são portas abertas para os maus espíritos entrarem.

O que Kardec disse sobre as mortes prematuras?

Afirmou que morrer prematuramente é um grande benefício que Deus dá à pessoa que falece, pois estará preservado das misérias da vida ou das seduções que poderiam desviá-la para a sua própria perdição. Não é vítima da fatalidade quem morre ainda jovem. É que Deus assim julgou que não é mais útil à essa pessoa viver na Terra.

Os espíritas fazem comunicação com os mortos?

De acordo com o que creem os espiritas, sim. Esse diálogo se dá por meio de um médium. O líder recebe a mensagem do falecido e a entrega às pessoas que estavam buscando se comunicar. Esse ato é chamado de psicografia. Apesar de ainda existir esse tipo de atividade, muitos médiuns afirmam que atualmente acontecem poucos casos de mensagens que os mortos enviam às pessoas via médium.

Os atos das psicografias hoje são os espíritos enviando mensagens como psicografar livros, por exemplo. Além da psicografia, existe a psicofonia que é o espírito falar usando a voz de um meio que, no caso, pode ser um médium. No espiritismo existe prece que é feita aos mortos. Há trechos que mostram que a pessoa, ao fazer a oração, conversa e se dirige ao falecido.

Por exemplo, há trechos da oração aos mortos que diz assim (o orador falando diretamente com o morto): “vindes a reentrar no mundo dos espíritos e, entretanto, estais aqui presente entre nós. Vede-nos e nos ouvis porque não há de menos entre nós e vós senão o corpo perecível, que vindes de deixar e que logo será reduzido a pó. (…) Se não podemos ir perto de vós, podeis vir perto de nós. Vinde, pois, entre aqueles que vos amam e que amastes. Sustentai-os nas provas da vida. Velai sobre aqueles que vos são caros. Protegei-os segundo o vosso poder e abrandai seus pesares pelo pensamento de que estais mais feliz agora e a consoladora certeza de estarem um dia reunidos a vós num mundo melhor”.

Além das preces e do trabalho dos médiuns, os espíritas acreditam que podem encontrar as pessoas que se foram por meio dos sonhos. Dizem que a pessoa que morreu recebe toda a energia que alguém emite em vida. Por exemplo, sentimento de dor prende o espírito a essa dimensão. Entendem que devem amar quem se foi sabendo que sua missão acabou. A morte do corpo físico seria uma mudança de estado de encarnado para desencarnado.

Os espíritas fazem preces pelos mortos?

Fazem, sim. Os espíritas fazem preces por todos que se foram (tanto os espíritos sofredores quanto os não sofredores). Os fieis entendem que, ao fazer uma prece para uma pessoa que desencarna, está levando palavras de encorajamento para ela na nova fase que passará.

O espírito permanece vivo, mas em outro plano vibratório. Muitas vezes são os espíritos sofredores que pedem uma oração porque se sentem menos infelizes, menos abandonados quando as pessoas pensam neles. A função da prece é dar coragem aos espíritos.

A prece ajuda, por exemplo, os espíritos sofredores a desejarem se elevar pelo caminho do arrependimento e da reparação. A prece também ajuda os espíritos a se desviarem dos maus pensamentos. Os espíritas entendem que a prece aos mortos alivia e abrevia os sofrimentos dos espíritos sofredores.

Quais são as preces feitas para os mortos?

Existem vários tipos de orações para os mortos. Tem a prece para a pessoa que acabou de morrer, tem a oração pelo inimigo morto, por um suicida e pelos espíritos arrependidos, entre outras.

Como é a prece pela pessoa que acabou de morrer?

Essa prece ajuda o morto a se desligar e abreviar a perturbação que existe na separação. Ajuda a tornar mais calmo o despertar. A prece diz assim: “Deus Todo-Poderoso, que a vossa misericórdia se estenda sobre essa alma (cita-se o nome do falecido) que vindes de chamar para vós. Possam as provas que ele (ou ela) suportou na Terra lhe serem contadas e as nossas preces abrandar e abreviar as penas que pode ainda experimentar como espírito. Bons espíritos que viestes recebê-lo e vós, seu anjo guardião, assisti-o para ajudá-lo a se despojar da matéria. Dai-lhe a luz e a consciência em si mesmo, a fim de tirá-lo da perturbação que acompanha a passagem da vida corporal para a vida espiritual. Inspirai-lhe o arrependimento das faltas que pôde cometer e o desejo que lhe seja permitido repará-las para apressar o seu adiantamento para a vida eterna feliz. (Citando o nome da pessoas falecida, prossegue a prece), vindes de reentrar no mundo dos espíritos e estais aqui presente entre nós, vede-nos e nos ouvis porque não há de menos entre nós e vós senão o corpo perecível que vindes a deixar e que logo será reduzido a pó (…).”

Como é a prece pelo suicida?

A oração diz assim: “sabemos, ó meu Deus, a sorte reservada àqueles que violam as vossas leis, abreviando voluntariamente os seus dias. Mas sabemos também que a vossa misericórdia é infinita. Dignai-vos estendê-la sobre a alma de (cita-se o nome da pessoa que se suicidou). Possam as nossas preces e a vossa comiseração abrandar a amargura dos sofrimentos que ele experimenta por não ter tido a coragem de esperar o fim de suas provas (…).”

Como o espiritismo vê o suicídio?

O ser humano não tem o direito de tirar a própria vida porque, acreditam os espíritas, que só a Deus cabe tirá-lo do cativeiro terrestre quando entende que é o tempo apropriado. A justiça de Deus pode ser severa para quem se matou. Dizem que o suicida é como o prisioneiro que foge da cadeia antes de pagar pela sua pena. Mas, quando é recapturado, é mantido na prisão de forma mais severa. Dessa mesma forma acontece com a pessoa que se suicida. Ela está acreditando que pode escapar das misérias da vida, mas entra – com o suicídio, em uma infelicidade maior.

Como é a prece por um inimigo que morreu?

O espírita diz, nessa oração, que perdoa o mal que a pessoa o fez. Diz ainda que o morto possa se arrepender dos males que fez quando ainda estava vivo. O orador pede a Deus que afaste dele se alegrar com a morte da pessoa. Prega-se a caridade com o inimigo. O espírito entende que o mal que a pessoa o causou deve ser visto como algo útil ao seu adiantamento.

Jornalista, teóloga e professora. É doutoranda em Teologia pela Escola Superior de Teologia, no Rio Grande do Sul. Tem mestrado em Teologia pela Escola Superior de Teologia. Pós-graduação em MBA Gestão da Comunicação nas Organizações pela Universidade Católica de Brasília. Bacharelado em Comunicação Social, Jornalismo, pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília. Licenciatura plena em História pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília. Bacharelado em Teologia pela Faculdade Evangélica de Brasília

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