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Francês pede anulação oficial de batismo na Igreja Católica e pode abrir precedente perigoso

Aposentado de 71 anos exige ter seu nome retirado dos registros da igreja e ser “desbatizado”

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René Lebouvier fez uma solicitação incomum e seu processo contra a Igreja Católica será agora julgada por um tribunal. O resultado jurídico de sua denúncia poderá provocar uma brecha numa tradição que persiste desde o século 16: a manutenção do registro de batismo de parte da instituição católica.

O tribunal ordenou à diocese de Coutances e Avranches que “tome as medidas para o cancelamento definitivo dos registros de batismo, onde há menção que René Lebouvier foi batizado em 9 de agosto de 1940”.

Baseada no “direito ao respeito da vida privada”, a justiça francesa exige que esta anulação seja efetuada “usando como meio, a cobertura do escrito com tinta preta indelével, num prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de 15 euros por descumprimento”.  Embora o registro não seja público pode ser acessado por terceiros e isso “fere o direito do indivíduo”, esclarece a sentença.

Contestando a decisão, o bispo de Coutances e Avranches, Don Stanislas Lalanne, entrou com um apelo. “O batismo constitui um evento de caráter público. É um ato consumado, faz parte da história e não pode ser cancelado.” A Igreja também afirma respeitar a vontade dos pais que quiseram batizar o seu filho.

O registro mostra que René Lebouvier foi batizado quando tinha dois dias. Usando argumentos teológicos, a Igreja católica argumentou que “o batismo é o ato fundador de um novo nascimento na fé. É possível alguém cancelar o ato histórico do nascimento de uma pessoa?”.

René Lebouvier não se importa muito com isso. O aposentado se considera um “livre pensador” e diz não odiar a Igreja. Mas insiste: “Todos os membros de minha família são católicos e nos damos bem. Casei na primeira vez diante do padre de minha aldeia em 1962, assisti a funerais na igreja, e até frequento os almoços promovidos por eles para os anciãos!”.

Aos 71 anos, Lebouvier explica por que tomou essa decisão só agora, perto do fim da vida. Ele recebeu, alguns anos atrás, um certificado de “desbatismo”, emitido por uma associação de livres pensadores. Decidiu então iniciar o caminho para se desvincular formalmente do grupo de católicos fiéis da sua cidade. “Fiz isso para ser honesto com os católicos fiéis. Eu não era mais católico há muito tempo, portanto era uma coisa lógica. Mas quando o pároco me disse que não poderiam tirar meu nome dos registros, só podiam escrever o adendo: “Renegou o batismo em tal dia. Aquilo me deixou inquieto”, lembra ele.

Em 2009, Lebouvier ouviu as afirmações do Papa condenando o preservativo “enquanto os africanos morrem de AIDS” e soube da excomunhão de uma mãe e dos médicos brasileiros que concordaram em fazer um aborto de uma menina de 9 anos que engravidou depois de ter sido violentada. Aquilo lhe fez perder a cabeça. “Naquela altura, disse a mim mesmo que não queria ter mais nada com essa instituição. Até porque a Igreja avalia o número de seus fiéis pelos registros de batismo”, observa o aposentado, desejoso de se ver livre o quanto antes de seus laços com a instituição.

Para o Vaticano, esse tipo de pedido é considerado um “ato de apostasia, de heresia ou de cisma” e pode resultar na condenação eterna do requerente. René Lebouvier afirma que não pensa nisso e tem o apoio da Federação Nacional do Livre Pensamento, que acompanhou o processo e pôs o seu advogado à disposição do aposentado.

Para a Igreja Católica, é difícil avaliar as consequências desse caso. Se a justiça facilitar e obrigar que o “desbatismo” seja reconhecido oficialmente, quantos mais farão o mesmo tipo de pedido?  Alguns bispos temem que isso se torne prática comum numa França que vê o declínio constante do número dos batizados no país há diversas décadas.

Em 2009 foram batizadas 316.286 pessoas, sendo que 295.582 eram crianças menores de 7 anos. Dez anos antes mais de 400.000 crianças receberam o sacramento batismal.

Mesmo tendo perdido no primeiro julgamento, a diocese recorreu do veredito e o processo deve se estender por mais algum tempo. O procedimento para “sair da Igreja” é longo e complexo, mesmo assim há cerca de mil pedidos deste tipo por ano no país. Percebe-se que há “picos de insatisfação” após algumas posições consideradas polêmicas são anunciadas pelo Vaticano. Nos últimos anos, as revelações de escândalos de pedofilia acentuaram o fenômeno.

Traduzido e Adaptado por de Le Monde

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