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opinião

A paranoia do sucesso

Para o cristão, o verdadeiro sucesso é evidenciar o carácter de Jesus Cristo e cumprir a vontade de Deus na sua vida.

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Menino tentando alcançar o céu. (Photo by Samuel Zeller on Unsplash)

Vivemos dias em que o sucesso é endeusado, tomou o lugar de Deus. Todos querem ter sucesso. Os livros sobre “Como alcançar sucesso…” são inúmeros, a publicidade vende a ideia de sucesso, a ponto de muitos se sentirem constrangidos a fingir perante os outros que têm sucesso, para não correr o risco de virem a ser rejeitados, em especial nas redes sociais. Mas o fracasso também faz parte da vida. É com ele que aprendemos as maiores lições.

Toda a gente anda à procura da “chave do sucesso”. Desde o mundo dos negócios ao mundo religioso. Quando Billy Graham estava no auge do seu ministério todos queriam ser como ele: poder falar para multidões, jantar com presidentes, reis e primeiros-ministros, e viajar em avião particular. Só que isso não tem que ver com a bênção de Deus, mas sim com a máquina religiosa americana e uma certa cultura anglo-saxónica mimetizada por outros.

Alguém disse: “Não existe elevador para o sucesso. Você tem que usar as escadas”. Hoje até há uma profissão a que podíamos chamar “treinador de vida”, isto é, profissionais que fazem coaching, de modo a transmitirem competências sociais às pessoas e treiná-las com vista ao seu sucesso pessoal e profissional. Mas não nos iludamos, o melhor que podemos fazer é insistir numa postura de coerência e integridade, não nos deixando encantar com a glória deste mundo, nem procurar as luzes da ribalta, nunca sacrificando a alma a deuses estranhos. A grandeza de um homem não pode ser aferida pelas conquistas alcançadas, mas pela sua integridade.

Note-se que a Palavra de Deus ensina o segredo do verdadeiro sucesso. No Salmo 1, versículo 3, lemos que o justo que se deleita na lei do Senhor “será como a árvore plantada junto a ribeiros de águas, a qual dá o seu fruto no seu tempo; as suas folhas não cairão, e tudo quanto fizer prosperará”.

A beira das águas representa a dimensão espiritual, a nossa comunhão com Deus, que é dinâmica como os mananciais de águas. Ou seja, antes de mais, amá-Lo acima de todas as coisas, segundo o grande mandamento que Jesus Cristo ensinou (“Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento”, Mateus 22:37). Desde logo isso significa tirar o foco de nós próprios e colocá-lo no Senhor.

Se a nossa adoração, tanto individual como colectiva, persistir apenas em estados de alma passageiros, em emoções pessoais do momento, arriscamo-nos a ser como “a onda do mar, que é levada pelo vento, e lançada de uma para outra parte” (Tiago 1:6). O cristão adora a Deus por aquilo que Ele é e não como moeda de troca para receber a sua bênção, como uma espécie de indulgência espiritual que se “paga” a fim de receber um qualquer benefício.

As raízes na terra significam a nossa ligação aos outros, a nossa inserção na oikoumene. Se amamos a Deus amamos os outros, e o grande desafio é conseguirmos amá-los como a nós mesmos (“Amarás o teu próximo como a ti mesmo”, Mateus 22:39). Quem diz que ama a Deus e não ama o próximo mente, porque na realidade não ama um nem o outro: “Se alguém diz: Eu amo a Deus, e odeia a seu irmão, é mentiroso. Pois quem não ama a seu irmão, ao qual viu, como pode amar a Deus, a quem não viu?” (1 João 4:20). Mas o mandamento de amar o próximo inclui o desafio supremo de amar até mesmo os inimigos: “Mas a vós, que isto ouvis, digo: Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam” (Lucas 6:27).

O fruto representa alimento espiritual para o mundo, e a evidência do carácter de Cristo em nós. Paulo falava aos cristãos da Galácia em fruto do espírito: “Mas o fruto do Espírito é: amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança” (Gálatas 5:22). As pessoas precisam de alimento espiritual num mundo tão secularizado, materialista, hedonista e auto-centrado. É a Igreja, a comunidade das testemunhas de Cristo que com Ele estão comprometidas, que lhes pode oferecer tal fruto.

A folha representa a cura (espiritual) da Igreja para o mundo. A sociedade está moral e espiritualmente doente e precisa de cura. As folhas desta árvore simbólica, que é o justo, constituem o fármaco necessário para trazer cura para as nações.

Assim, o sucesso, do ponto de vista bíblico, resulta da obediência a Deus. Quando o Criador confrontou Caim disse-lhe: “Se bem fizeres, não é certo que serás aceite?” (Gênesis 4:7). E falando ao Seu povo: “E o Senhor te porá por cabeça, e não por cauda; e só estarás em cima, e não debaixo, se obedeceres aos mandamentos do Senhor teu Deus, que hoje te ordeno, para os guardar e cumprir” (Deuteronômio 28:13). Para o cristão, o verdadeiro sucesso é evidenciar o carácter de Jesus Cristo e cumprir a vontade de Deus na sua vida. E para isso não há truques, nem guiões, nem segredos.

Nasceu em Lisboa (1954), é casado, tem dois filhos e um neto. Doutorado em Psicologia, Especialista em Ética e em Ciência das Religiões, é director do Mestrado em Ciência das Religiões na Universidade Lusófona, em Lisboa, coordenador do Instituto de Cristianismo Contemporâneo e investigador.

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