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opinião

A Bíblia está contra a Bíblia?

Ou, como o mal de usar versículos isolados vem prejudicando a igreja nesta geração.

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Jesus estava com fome por causa do seu longo jejum de 40 dias e 40 noites. Ele tinha acabado de ser batizado no rio Jordão por João batista e o Espírito Santo o levou ao deserto, com o objetivo de que ele fosse tentado pelo Diabo. E a palavra aqui pode ter significado também de testar e provar.

Então ele apareceu, e fez logo de cara uma pergunta carregada de ironia para Cristo. “Se és o Filho de Deus”. Aqui cabe ressaltar que, possivelmente o próprio acusador já soubesse que Jesus era o Cristo mesmo, o enviado, o Deus encarnado. Então esta suposição “se” poderia ser, de certa forma, uma insinuação quanto à divindade de Jesus, mas feita de forma irônica. E segundo o teólogo D.A.Carson pode-se ainda concluir que o objetivo de Satanás era, então, incitar Cristo a usar os poderes que eram seus por direito, mas que ele os abandonou voluntariamente para realizar a missão do Pai.

Ele pede a Cristo que transforme aquelas pedras do deserto em pão. De onde ele tirou essa ideia? Pedra e pão, no deserto podem ser confundidas? Talvez. Mas para o diabo a fome poderia fazer com Cristo se utilizasse, naturalmente do poder divino e operasse esse milagre em causa própria. “Transforme!”, “ É mais do que justo”, “Você é cabeça, e não cauda…”. Como assim ser o Deus encarnado e passar fome? Isso não seria muita humilhação? Essa pergunta foi ecoada lá na crucificação. Lembram do “ Se és Filho de Deus, desce da cruz”?

Cristo estava com fome, fato. Mas, ele logo lembra lá de Deuteronômio onde Moisés afirmou que mesmo que o povo tenha caminhado por 40 anos no deserto, em nenhum momento nada faltou. Deus não deixou o seu povo passar fome, pois enviou, no tempo certo, o maná. O maná é o pão que caiu do céu, e é diferente de pedras transformadas no deserto pela ansiedade.

Deus cuida dos seus ao seu próprio modo. E Cristo sabia também que, enquanto o pão não chegasse, ele viveria das palavras do seu pai e não andaria no seu próprio comando. “As Escrituras dizem que não é só de pão que vive o homem, mas de toda a palavra que procede da boca de Deus”.

Eles foram do deserto para Jerusalém. O templo foi construído em um monte, então foram para o pináculo que era a parte mais alta. A tese agora do diabo era se utilizar diretamente das escrituras para fazer mais uma sugestão para o Filho de Deus enfraquecido. O Diabo citando e interpretando as Escrituras… Nada mais antigo, hein?

Aí entra o lindo Salmo 91. Esse salmo é, certamente dos mais famosos, dentro e fora do mundo cristão. Lá as promessas foram maravilhosamente colocadas para dar ânimo aos cristãos que passam por dificuldades. Mas o Diabo não respeitou o contexto do texto, isolou um versículo e quis impor a sua própria hermenêutica, o seu jeito “próprio” de interpretação, o seu entendimento especulativo das escrituras.

A proposta é: Jogue-se. E os anjos virão em milhões para evitar a queda. Verdade ou mentira? Está escrito, e você acabou de dizer que viveria de toda a palavra que procede da boca de Deus.

A Bíblia é incrivelmente coerente, pois Cristo volta novamente a Deuteronômio para lembrar que não se deve pôr o Senhor à prova, como aconteceu lá em Massá. O povo neste episódio sentiu sede, e foi “exigir” que Moisés arrumasse água de algum lugar. “Por que você nos tirou do Egito?” “Dê-nos água”, gritavam a ponto de bater no Patriarca. E ainda vociferava, “O Senhor está conosco, ou não”?

Massá e Meribá são palavras que significam “provação” e “rebelião”. Cristo, que é o verbo, sabia da exata significação do Salmo 91, e não ousou entrar em disputa sobre o amor cuidadoso do Senhor. “Não ponha à prova o Senhor teu Deus!”, “Não seja crente infantil que acha que pode subornar Deus com sua fé. Eu creio, eu determino…”. Ou ainda, “Pare de querer as coisas do seu jeito e no seu tempo”. Deus não aceitará nenhuma presunção leviana, somente confiança e obediência. Jesus percebeu que Satanás estava propondo uma espécie de chantagem espiritual da qual ele não faria parte.

Cristo está agora em cima de um monte elevadíssimo, ao ponto de ver todos os reinos deste mundo. O Diabo o levou para lá com o fim de fazer uma última proposta, mais ousada e direta.

“Você está vendo tudo isso, toda essa grandeza e poder? Pois, se você me adorar, terá toda esta glória terrena”. O livro do embate, do começo ao fim aqui foi Deuteronômio que significa “repetição”. E Cristo recorre a ele novamente pra lembrar a satanás que de adoração ele não entende nada. “Adore o Senhor teu Deus, e só a Ele preste culto”, avisou. Depois desta investida final, o demo o deixou. E Jesus foi servido pelos anjos.

Algumas considerações à partir deste texto:

Precisamos evitar versículos isolados e longe do seu contexto histórico. Nunca aceite que pastores ou mestres não te expliquem, de preferência todo aquele capítulo correspondente a uma verdade ensinada. “O meu povo é destruído porque não me conhece; e tudo por culpa de vocês, sacerdotes, porque vocês mesmos não se interessam em me conhecer”… Oséias 4:6

Devemos ainda deixar o “espiritualismo” de lado e se afadigar no estudo da palavra. Quanto mais claras ficarem as Escrituras para nós, tanto melhor nos sairemos na nossa vida cristã. Deus, deseja que a sua Palavra seja como um amanhecer claro e corra no nosso meio como águas cristalinas e abundantes. “Então, conheçamos e prossigamos em conhecer ao Senhor; a sua saída, como a alva, é certa; e ele a nós virá como a chuva, como chuva serôdia que rega a terra”. Oséias 6:3

Precisamos ainda nos afastar de pastores e suas exibições “espetaculares” no púlpito. Essas dramatizações teatrais irão atrair aos incautos, desprevenidos, aos ingênuos. Mas os cristãos amadurecidos desejaram aprender as escrituras ardentemente.

Muitas igrejas têm vendido o sofrimento como um produto, e está bastante interessada nos teus problemas e trazer soluções fáceis e baratas a todo tempo. “Pare de sofrer”, não é o que ouvimos a todo tempo? Mas, ao contrário, Deus quer que você encare seus desafios como vindos dele mesmo, para te aperfeiçoar e te amoldar segundo a sua graça e padrão. E devemos seguir os passos de Jesus, tanto no sofrimento quanto na sua ressurreição. À Ele toda a Glória, sempre!

Jornalista e escritora, com um livro publicado "Feminilidade Bíblica - Repensando o papel da mulher à luz de cantares", e também escritora de livro didático. Casada com Nelson Ferreira, pastor da IPB, mãe da Acsa e avó da Clarisse. Em breve publicará seu primeiro romance .

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